O edital foi lançado no último dia 25 de julho, em Brasília, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O período de inscrições vai até o dia 8 de setembro e podem participar da seleção órgãos e entidades dos governos federal, estaduais, instituições de ensino superior, organizações da sociedade civil, agências de desenvolvimento e organizações privadas ligadas à cultura e à pesquisa. O edital não era realizado desde 2015.
Superintendente do Iphan no RS, Rafael Passos considera a retomada do programa um grande incentivo à pesquisa e salvaguarda da proteção do patrimônio imaterial do Brasil. Ele explica que uma das linhas temáticas do edital se refere ao Inventário Nacional de Referências Culturais, que são as manifestações do patrimônio imaterial, incluindo recursos para os detentores deste patrimônio, possibilitando pesquisas e dando condições para que tais expressões continuem existindo na sociedade brasileira.
Como exemplos de patrimônio imaterial, Passos cita a capoeira, o primeiro patrimônio imaterial nacional a ser reconhecido no Brasil – posteriormente, reconhecido também junto à Unesco como patrimônio imaterial mundial. “Há uma lógica de que a capoeira tem relação com o processo de escravidão e toda a relação direta entre continentes, então a cultura africana chega ao Brasil e se constitui aqui numa cultura específica”, explica.
O patrimônio imaterial pode estar também relacionado ao modo de fazer. No caso do RS, a tradição doceira de Pelotas, com receitas específicas passadas de geração em geração, é outro exemplo de patrimônio imaterial, assim como o pão de queijo mineiro. “Você tem desde os modos de fazer até modos de expressão, como o Bumba Meu Boi, no Maranhão, uma forma de expressão artística reconhecida como patrimônio imaterial”, destaca o superintendente do Iphan no RS.
Agora, ele espera que as pesquisas apoiadas pelo edital tragam à tona manifestações culturais e saberes do Rio Grande do Sul. É o caso das lidas campeiras e toda a tradição do trabalho do guasqueiro – artesãos especializados em produzir artefatos cuja matéria-prima é o couro cru (as tiras de couro cru são chamadas de guascas) –, dos esquiladores – que tosam a lã de ovinos para fabricação de roupas e acessórios, e de doma – espécie de adestramento de cavalos.
“São práticas que devem ser reconhecidas e protegidas, inclusive frente à expansão do agronegócio, do tipo de agricultura que vai transformando as práticas que precisamos, cada vez mais, proteger”, afirma.
Passos cita ainda o desejo de ver surgir pesquisas relacionadas a povos de matriz africana e indígenas, como o reconhecimento da presença Guarani e das ruínas de São Miguel como local sagrado para eles. “É isso que temos trabalhado no momento atual e numa perspectiva de futuro.”
Na primeira linha, os projetos devem ter orçamento entre R$ 200 mil e R$ 500 mil; na segunda linha, entre R$ 150 mil e R$ 400 mil; e, na terceira, R$ 150 mil e R$ 300 mil.
Durante o lançamento do edital, o presidente do Iphan, Leandro Grass, disse que a nova edição do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI) representa “a retomada da valorização do patrimônio imaterial, da cultura popular e dos saberes tradicionais”.
O órgão destaca que o valor a ser pago em 2023 “supera todo o investimento do Iphan em patrimônio cultural imaterial nos últimos quatro anos”, além de estar “mais de 1.000%” acima do valor disponibilizado em 2022, último ano do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Rafael Passos pondera que o patrimônio imaterial é o último dentro das manifestações dos bens culturais e, por isso, muitas vezes seu sentido e importância é menos percebido pela população em geral.
Ele lembra que quando o Iphan foi criado, em 1937, sua atuação começou pela proteção do patrimônio material. Tempos depois, em 1961, o órgão iniciou também a proteção da arqueologia. O patrimônio imaterial foi o último a ter uma salvaguarda legal, por meio de decreto publicado no ano 2000. O decreto então instituiu a Política Nacional de Patrimônio Imaterial.